sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Gaslighting e Mansplaining e por quê a gente fica brava

Você está numa mesa de bar com amigos, conversando sobre relacionamentos em geral. Você coloca uma opinião sobre o assunto, que é baseada em fatos que já ocorreram com você. Aí um amigo homem que nunca passou por algo parecido te diz "Não, mas você não entendeu. Deixa eu te explicar como funciona."

Você está numa reunião da firma, falando sobre um projeto que você lidera. Um homem que está ouvindo sobre o projeto pela primeira vez te interrompe para dizer "Eu entendi sua conclusão, mas não é isso. Se você analisar deste ou daquele jeito, você vai chegar na conclusão certa."

Você está discursando sobre um assunto que você domina, sobre o qual você estudou muito, além de ter vivências pessoais sobre. Sempre - e TODA VEZ-  que você finaliza um ponto, um homem que leu meia dúzia de artigos sobre o assunto e nunca viveu aquilo, manda uma frase do tipo "entendo, mas não concordo" ou "mas EU não sou assim, e isso invalida o argumento" ou "concordo, mas acho que você está explicando errado".

Você faz um post no Facebook sobre política, aliando o conteúdo de um link à sua percepção, num texto bem formulado. Um homem que não é profissional do assunto, e portanto, até prove o contrário, tem o mesmo nível de conhecimento que você comenta "você está sendo ingênua. leia este e este artigo que você vai entender melhor".

Você participa do movimento feminista, há anos. Você já participou de comícios, grupos de discussão, palestras e turmas de leitura. Você já falou sobre o assunto com muitas pessoas, já ouviu as mais diversas opiniões sobre o assunto. Pela sua vivência, você sabe que as vezes tentar educar não é suficiente, as vezes é necessário mostrar que a pessoa faz parte do grupo opressor, mesmo que sem querer. Aí vem um homem, que não conhece a luta, e diz que você "está muito feminista" ou que as vezes "você é incisiva demais, tem que falar com mais doçura".

Você chama um amigo para trocar uma ideia sobre um assunto que não é a especialidade dele. Ele responde que "claro, vamos lá, não domino muito o assunto, mas posso te ajudar a entender".

Já aconteceu com você?

Você já sentiu que um homem estava agindo como se soubesse muito mais que você, sobre assuntos nos quais definitivamente, não é o caso?
Que um homem estava te tratando como uma criança ingênua?
Que um homem parecia achar que a opinião leiga dele valia mais que a sua (mesmo você conhecendo muito o assunto).
Você já sentiu que tentava ensinar um homem sobre um assunto que você domina e ele teoricamente tem interesse, mas percebeu que ele insistia em não absorver nada do que você falava, e só respondia o pontos que lhe interessava?

Chegou o dia então, de nomear esse sentimento que acompanha todas as mulheres.

MANSPLAINING.


Querer ensinar a uma mulher algo que ela já sabe e demonstra claramente saber, porque uma mulher necessariamente não teria capacidade intelectual para compreender um determinado assunto; e como homem, é impossível que você não saiba melhor.

Ou quando o homem quer ensinar à mulher quando ela tem o direito de se sentir oprimida e quando não tem. Geralmente, acontece quando uma mulher aponta o machismo do homem e ele adota uma postura auto-defensiva, embora aparentemente cortês, querendo explicar por que aquilo que ele fez não foi machismo, que machista é aquele outro cara, não ele.

OK.

Vamos dizer então que isso te aconteceu, e você se irritou.
Ou mesmo que seu namorado atrasou 2 horas num compromisso que vocês combinaram.
Ou que seu irmão levou para um churrasco todas as cervejas que você comprou para o jantar com os amigos de amanhã.
Ou que seu pai pegou seu celular sem sua autorização e respondeu uma mensagem do seu peguete.

Quando você reagiu....
Ele te disse que você estava exagerando?
Que as suas reações eram muito bravas?
Que você estava inventando, que aquilo nunca tinha acontecido?
Disse que você estava louca?
Deu risada e disse que você só podia estar "naqueles dias"?
"Calma. Relaxa. Você se irrita muito fácil. Esquece, tá tudo bem."

Ele invalidou sua revolta/braveza/irritação.
Ele te silenciou.
Ele fez você duvidar da sua própria razão.
"Será que eu sou paranóica?"
"Será que isso é coisa da minha cabeça?"

Então de novo, vamos nomear essa atitude que, de fato, nos enlouquece:
GASLIGHTING.
Aqui já tem um texto beeeem explicativo e didático sobre esse assunto:
Mulheres, não se deixem silenciar!
Eu sei que os double-standards (vou falar sobre isso no futuro, prometo!) estão aí, e enquanto um homem que reitera sua opinião com firmeza é um homem forte e incisivo, talvez quando você fizer o mesmo vão te dizer que você está sendo agressiva.
Mas não é verdade. Sua voz tem tanto valor quanto a de qualquer homem, e nunca deixe ninguém te dizer que você deveria ter feito de outro jeito, ou que você é louca. Você não é. 
Você é importante, sua opinião tem relevância, e seus sentimentos e reações não estão errados.

Homens, parem, por favor.
Eu sei que vocês não fazem de propósito. Eu sei. Mas se vocês não querem fazer isso com as mulheres do seu convívio, vigiem-se. Desconstruam-se.


"TODA FEMINISTA É BRAVA."


Ok, você entendeu tudo isso, mas ainda não entende por que raios as feministas as vezes são TÃO bravas.

Vamos lá...
Nós temos presença nas militâncias, vivência como mulher, e vemos muito pessoas tentarem ensinar como militar, sendo que elas mesmas nunca defenderam com afinco uma causa.
Elas não tem experiência na militância pra saber se precisa ou não as vezes ser um pouco mais incisivo.
E quer saber: se elas quiserem militar nesse estilo paz e amor, são muito bem vindas, mas geralmente as pessoas que questionam a nossa militância, são pessoas que não falam NADA quando o amiguinho posta algo com conteúdo racista/machista/preconceituoso.
Ou seja, a pessoa concorda com a pauta em linhas gerais (exemplo: concorda que machismo é ruim), se dá o trabalho de vir questionar como EU abordo a questão e luto contra, mas não se dá o trabalho de questionar quem de fato está disseminando machismo.
Além de parecer prepotente (a pessoa querer ensinar a pessoa algo que ela conhece melhor), é um pouco incoerente, não?

Então este é um primeiro ponto, sobre as pessoas que vem nos "ensinar a militar": você concorda com a causa, em linhas gerais? Então que tal ir se informar sobre ela? Que tal começar a questionar suas próprias atitudes e desconstruir o machismo que mora dentro de você? Que tal usar seu espaço na sociedade, entre outros homens, para tentar desconstruir o machismo? Educar seus amigos, quando eles estiverem propagando machismo e tendo atitudes cretinas?
Todas essas atitudes deveriam vir antes de aparecer no nosso espaço para dizer que estamos fazendo aquilo errado.


Não quer dizer que estamos sempre certas. Mas quer dizer que algumas feministas mais agressivas e mais misândricas* talvez sejam assim porque vivenciaram abusos e violências sobre as quais você não sabe. Sem contar as mil vertentes do feminismo**.
Quer dizer que queremos ouvir dicas e opiniões sobre o movimento, mas principalmente de mulheres, e de pessoas que já estão dentro do movimento e sabem como ele funciona.

Quer dizer que nós só seremos feministas bravas, irritadas e agressivas se VOCÊ:
-nos tratar com superioridade e condescendência,
-tiver atitudes machistas e, quando te corrigirmos, você não se retratar ou pelo menos colocar a mão na consciência,
-ficar dando pitaco na nossa luta,
-for um completo babaca, arrogante ou misógino.


O segundo ponto é sobre a importância da militância INCOMODAR, ser meio brava mesmo. Pra falar dessa vou usar minha experiência pessoal:

Eu milito pelas causas que acredito, e elas não são poucas, o que faz de mim uma pessoa tão, mas TÃO CHATA, que esse é o nome do blog.
Eu milito pelo feminismo, pelos movimentos LGBT e negro (claro, como apoiadora e coadjuvante, jamais achando que sei mais que os negros e os homossexuais, porque né? coerência é importante.), em geral, pela igualdade de direitos e tratamento perante a sociedade.
Eu milito para o fim do discurso de ódio, milito pela proteção das minorias, milito em defesa dos pobres, milito pela importância de tentar não se informar de forma unilateral.
Geralmente, as coisas que eu defendo são coisas que as pessoas privilegiadas não querem ver, porque elas estão muito confortáveis em seus lugares.
Elas acham que homofobia é problema do cara que espanca gay na Paulista, que machismo é problema do cara que obriga a mulher a sair do trabalho ou do estuprador louco dos becos escuros, que racista é a menina do Grêmio, que ignorância é um problema dos pobres/nordestinos/petistas.

O comportamento em comum aqui é que eles NUNCA olham pra dentro.
Eles entendem que o problema existe, mas o problema é sempre o outro, eles estão com a consciência limpa.

E esse - ao meu ver, na minha experiência de militante -  é o problema do discurso de "eu já sou feminista (ou anti racismo, anti homofobia, etc), não precisa me corrigir".


Porque se você só defende que negros tem que ter representatividade na mídia, só defende que homossexuais devem ter direitos iguais, só defende que a mulher deve ser tratada com o mesmo respeito que homens, você não está fazendo essa pessoa olhar pra dentro.

Defender essas pautas faz sim parte da militância (e parte importante), mas as pessoas privilegiadas (que são das que mais tem que mudar seu comportamento) vão simplesmente curtir seu post e concordar, e comentar coisas como: "afe, realmente, que absurdo esses homens que acham que mulher merece ser estuprada"/ "é um absurdo essa torcedora racista" / "que triste que existam pessoas que espanquem gays".

Mas eles não vão olhar pra dentro pra ver que eles são coniventes dessa violência, que eles que criaram o ambiente e a sociedade na qual aquela violência é possível.

Eles não vão rever os próprios conceitos e parar de tentar agarrar uma gostosa na balada (porque ela tava de minissaia e devia estar querendo)/ começar a dividir as tarefas de casa/ parar de dizer que quando negro reclama de racismo ele tá sendo vitimista ou de reclamar de ai que saco essa patrulha do politicamente correto / parar de dizer que gay pode ser gay mas não pode beijar/andar de mão dada/ser afeminado porque aí já tá desrespeitando os outros.

Se um negro diz que você está sendo racista, você provavelmente está.
E no caso de não estar, aceite mesmo assim. Depois de séculos de escravidão, acho que o mínimo que você pode fazer é baixar a cabeça nessa hora.
Se um homossexual diz que você está sendo homofóbico, você provavelmente está.
Não fique com orgulho ferido e argumente até ele se cansar. Olha para dentro e aceite.
Se uma feminista diz que você está sendo machista, você provavelmente está.
Não discorde. Pergunte porque e tente entender como aquilo a ofendeu.


Parece difícil, eu sei.
Mas é a lição de empatia mais maravilhosa... <3


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*Misandria: ódio aos homens. É o oposto de misoginia, que é a base do machismo.
**Um dia eu faço um post só sobre as muitas vertentes, mas um recado importante:
Todo e qualquer movimento que atinge um tamanho considerável adquire vertentes.
Temos vertentes super fundamentalistas de quase qualquer religião e temos vertentes acolhedoras; e nem por isso as pessoas deixam de se identificar com elas.
Pois bem, o feminismo tem muitas vertentes com as quais eu não concordo (exemplo: algumas vertentes defendem principalmente a questão de gênero, e ignoram a questão racial; por vezes exclui as pessoas trans e tem aversão a homens).
Porém, o que rege o feminismo é: oi, sou mulher, quero receber respeito simplesmente por existir e independente do tamanho da minha saia; oi, não quero que minha aparência ou minha vida sexual sejam consideradas os principais elementos de quem eu sou; oi, sou mulher, quero ganhar o mesmo salário estando na mesma função; oi, não quero ouvir sua opinião na rua sobre as minhas coxas; oi, quero ver outras mulheres como companheiras e não como rivais; oi, não quero que a minha existência seja pautada pela maternidade ou por ter ou não um homem na minha vida, oi, não quero ser silenciada em todas as discussões.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O feminismo e o mercado de trabalho

A foto é de uma pesquisa que saiu no Jornal da Globo ontem.
Foi perguntado a entrevistados de países desenvolvidos e emergentes (e eles separaram o Brasil em uma terceira coluna) sobre o que eles achavam que era um diferencial para se atingir o sucesso.
O ponto que eu queria chamar atenção aqui é o "SER HOMEM".
Sempre falo aqui das desigualdades que ainda existem no mercado de trabalho, sobre como as mulheres ainda ganham menos ocupando os mesmos cargos (no Brasil a diferença média é de 27%), sobre o preconceito que ainda existe em relação a mulheres que engravidam no meio executivo, e até mesmo os double-standards que sem nem percebermos criamos para as mulheres (o homem é visto como determinado enquanto a mulher é teimosa, o homem tem personalidade forte enquanto a mulher é agressiva, o homem é seguro enquanto a mulher é arrogante, etc etc).
E aqui fica claro que 27% dos brasileiros ainda acredita que simplesmente ser homem já é um fator diferencial que te faz mais propenso ao sucesso.
Então sim, eu sou feminista: alguém que acredita e busca a igualdade social, política e econômica entre os gêneros.
Porque infelizmente, ela ainda não chegou.



segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Mais amor, por favor...

Reflexão pra mim e pra você, nessa segunda-feira amarga:
Quando foi que nos tornamos tão cheios de ódio? 
Em que momento esquecemos os ensinamentos (para alguns de Cristo, para outros de seus pais) de que sempre devemos ser humildes e não nos julgarmos superiores aos outros? 
Por que de repente todos somos tão prepotentes e tão certos de que a nossa verdade é maior/mais inteligente/mais válida que a verdade do outro? 
De onde veio tanta arrogância, que nos faz xingar em pleno espaço público (porque é isso que o Facebook é hoje) um colega de burro ou ignorante, só porque ele pensa diferente? 
Quão grande é nosso ego para julgarmos que alguém que não concorda com nossa opinião deve estar falhando em entender alguma coisa que nós, seres iluminados, temos o dever cívico de explicar de novo e de novo? 
Por que não conseguimos entender que toda história tem dois lados? 
Quando vamos entender a diferença entre liberdade de expressão e discurso de ódio? 
O que falta para percebermos que nossa liberdade de agir como queremos acaba no momento em que queremos tolher a liberdade de pensar diferente do outro? 
Quando vamos perceber que o ódio turva nossa visão? 
Por que não enxergamos que nosso ódio verbal é coadjuvante da violência física?
Onde foi a humildade?
Onde foi o respeito?
Onde foi o amor?

"O mundo preconceituoso e violento no qual vivemos faz, muitas vezes, o AMOR e o RESPEITO parecerem exigência demais"

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Sobre a reação à revolução

Recomendo aqui este texto lindeza sobre como tanto post defendendo direitos das mulheres vira sobre como algumas feministas são agressivas, tanto post sobre movimento negro vira sobre a "patrulha politicamente correta", tanto post sobre movimento LGBT vira sobre uma suposta "liberdade de expressão" tolhida - resumindo, sobre como as pessoas muitas vezes ignoram o conteúdo do debate, mais preocupadas em condená-lo do que entendê-lo.

Tenho certeza que todas as pessoas que lutam por ideais de minorias ou que desafiam o senso comum vão se identificar... rs


"As pessoas que não fazem absolutamente nada para mudar qualquer coisa que seja no mundo se sentem atacadas por quem faz e, sem demora, buscam a perfeição inexistente nas pessoas que as lembram que não viemos ao mundo a passeio e podemos sim sair da zona de conforto e fazer alguma diferença."



http://www.modefica.com.br/a-hipocrisia-nossa-de-cada-dia-e-porque-dela-ser-tao-manipulada-contra-os-ativistas-sociais/#.VC7RuvldUVj

Conceitos: Justiça, igualdade e equidade

Qual imagem te parece mais justa?
A primeira representa a falsa simetria / falácia do mundo justo: tratar igualmente pessoas/grupos que não tem igual status/poder/direitos na sociedade. Parte de um raciocínio de meritocracia, onde cada um teria condições iguais para lutar por seu espaço.
Exemplo: por que chamar negros de macaco não pode porque é racismo e chamar brancos de palmito pode? por que os gays querem fazer uma parada gay e ter um movimento de orgulho gay e os héteros quando fazem são homofóbicos? por que uma pessoa pobre tem cotas para entrar na faculdade? por que existem leis específicas para proteger as mulheres de violência doméstica?

A segunda imagem representa equidade: tratar com maior cuidado as pessoas/grupos que foram/são historicamente subjugados na sociedade, sofrem preconceito institucionalizado, são tratados como inferiores, e detentores de menos direitos.

Exemplo: cotas para negros e pobres (porque os pobres tem menos oportunidades de estudo e os negros tem baixíssima representatividade nas faculdades e nos cargos de gerência); lei maria da penha (por que 35% dos assassinatos de mulheres são cometidos por seus próprios parceiros, em casa), feminismo (porque a mulher ainda recebe 70% do que um homem na mesma função, e ainda tem homem que acha que estupro é justificável), leis contra o racismo (porque a escravidão e o apartheid ainda são muito recentes, a representatividade na mídia é pífia e tem gente que ainda acha que negros 'não pertencem' a determinados lugares), a necessidade de uma lei contra a homofobia (pq ainda que muita gente morra por muitas razões, os gays ainda são vítimas de agressão e assassinato pelo simples fato de serem gays, e um político fazendo apologia ao "enfrentamento" dessas minorias e os tratando como doentes ainda é defendido por parte da sociedade como liberdade de expressão).

Vamos pegar uma minoria específica e fazer um paralelo simples:
É como se o mocinho alto da esquerda representasse o hétero.Ele não precisa de banquinho pra ver o jogo. Aí vamos dizer que o gay "discreto" é o garoto do meio, e o gay "afeminado" é o da direita. Eles precisam de banquinhos, não para ver o jogo melhor que o hétero, mas para ver o jogo IGUAL. 
A lei não pode tratar como iguais grupos que a sociedade não trata igual. Pois eles sempre precisarão de MAIS proteção, por serem alvos de preconceito e discriminação com MAIS frequência.

E aí, se você fosse o moço da esquerda, você cederia seu banquinho para a pessoa ao lado?



Racismo para brancos - reconhecendo seu privilégio

Vou reproduzir as falas que já ouvi de muitas mulheres negras, já que o assunto racismo tá em alta e o povo tá cheio de opiniões.
(Estou apenas reproduzindo o que aprendi com elas, já que eu pessoalmente não tenho vivência alguma nesse sentido.)
Até pouquíssimos anos atrás, negro era escravo, negro não podia votar, negro não podia usar o mesmo banheiro que branco, muito menos casar com um. Tudo isso que hoje parece absurdo e arcaico só acabou, sabe porque? Porque os brancos resolveram perceber sozinhos que aquilo era absurdo e mudaram as regras do jogo?? Naaaaão! Isso acabou porque milhares de negros no mundo todo se levantaram contra essa situação, fizeram barulho, protestaram, e muitos morreram nessa luta. Enquanto isso acontecia, tinha um monte de branco achando absurdo aquele barulho todo "ai que saco esses negros querendo direitos demais, ai que frescura, liberdade nem é tudo isso". E também tinha um monte de negro que, tristemente e não por culpa deles, de tanto ouvir a vida toda que era inferior, acabou concordando, e também achava aquele barulho todo uma coisa chata.
Mas tenho certeza que hoje em dia nenhum negro acha que dá pra voltar pra como era antes..
A maioria dos brancos também não acha, e os que acham não podem falar isso em voz alta porque a lei assegura que isso não é liberdade de expressão, isso é OPRESSÃO e racismo.
Aí, hoje em dia esses absurdos não existem mais. Mas sabe o que ainda existe?
Ainda existe gente olhando torto pra negro em ambiente de elite, ainda existe gente gritando macaco no estádio, ainda existe pai que não quer que o filho namore negra, ainda existe negro sendo preterido num emprego, ainda tem negra ouvindo alguém pedir pra ela alisar o cabelo se quiser uma promoção. Ainda existe novela que, apesar da população brasileira ser em sua maioria negra, mostra pouquíssimos personagens negros. Ainda tem novela que quando tem personagens negros, é sempre dentro do estereótipo de mulata-sambista-gostosa, família-da-favela, empregada doméstica e motorista. E quase nada de personagem negro que é chefe de empresa, personagem negro que é protagonista de novela que não se passa no subúrbio.
E aí, vem um homem branco rico e faz um seriado sobre mulheres negras pobres. E o seriado chama Sexo e as Negas. E as personagens são uma camareira, uma cozinheira, uma operária e uma costureira. E elas são sensuais, e vão passar o seriado falando sobre - adivinhe - homens e sexo.
E aí as mulheres negras, que não aguentam mais se ver representadas dessa forma, que não aguentam mais uma mídia que contribui para criar uma sociedade onde o racismo é velado e natural, que não aguentam mais a falta de representatividade da verdadeira cultura negra na TV, elas vão lá e protestam contra o seriado.
Frente a isso, a mídia e o autor -branco- da série, olharam pra dentro e falaram PUTZ, se elas tão falando é porque deve ser verdade, deixa eu dar voz sobre o que é ou não é racismo pra essas pessoas que sentem ele na pele. Só que não foi isso que aconteceu. O autor e mais um monte de branco (e sim, alguns negros) falaram que essa história de politicamente correto tá chata demais, que não se pode mais fazer piada, que agora tudo é preconceito, e "ai que saco esses negros querendo respeito, ai que frescura, representatividade nem é tudo isso".
Tá vendo onde eu quero chegar?
Aí que os negros, apesar de toda opressão que sofreram, apesar do que ainda sofrem e apesar da sociedade ainda ser conivente com a sua desumanização, conseguiram se unir e ter orgulho de ser quem são. Isso é o 100% Raça Negra. Isso que é o Dia da Consciência Negra. Não é "privilégio", é resistência. É dizer "olha, a sociedade me oprimiu por séculos, mas de alguma forma eu tive forças pra me levantar e dizer basta, dizer que eu tenho orgulho de ser quem eu sou". E é por isso que racismo inverso não existe, é por isso que usar uma camiseta 100% Branco te faz sim um babaca racista, assim como exigir um dia da consciência branca, assim como dizer que vc sofre racismo pq um dia seus amigos te chamaram de palmito. Perceba o quanto a sociedade não condena a cor da sua pele, perceba que isso é um privilégio, e perceba que não, vc não está em posição de dizer o que é racismo e o que não é.


com amor, de uma branquela privilegiada mala insuportavelmente defensora dos direitos humanos.
abaixo, o link para um texto escrito pela diva Djamila Ribeiro, que, sendo negra, tem muito mais propriedade pra falar do assunto:
http://www.cartacapital.com.br/blogs/escritorio-feminista/seja-racista-e-ganhe-fama-e-empatia-5564.html

Desejo do dia: Empatia

Mais um desejo de amor do dia: Empatia! 
Empatia é quando você para pra ver como outra pessoa se sente, tenta se por no lugar dela para compreendê-la ou ajudá-la. Você acha que você tem empatia com o próximo? Vamos refletir?
Quando a gente quer exercer a empatia, tem um uma coisinha essencial para fazê-lo verdadeiramente: ir atrás de entender como aquela pessoa se sente. Não adianta só imaginar que tal coisa ofende ou agrada, se você realmente quer ajudar uma pessoa/grupo, você precisa ir conversar com ela - ou um representante do grupo - pra entender se é isso mesmo. Porque as vezes, mesmo se a gente tenta com a melhor das intenções, a gente não consegue entender como é estar na pele do outro, pelo simples fato que não estamos.
E aí, quando falta essa empatia ~verdadeira~ o que acontece? É branco dizendo que tal coisa é ou não é racismo (e ignorando o que um negro tem a dizer); é hétero dizendo que tal coisa é ou não é homofobia (sem nunca ter perguntado à um gay como ele se sente); magro dizendo que o gordo está exagerando (mas não tem uma sociedade inteira falando pra ele que o corpo dele é feio); homem dizendo que mulher é vitimista (mas nunca precisou temer pela invasão da sua sexualidade), é gente pra quem nunca faltou comida falando mal de assistência social, e etc etc.
Infelizmente, ainda que a sociedade tenha evoluído muito, ainda temos um longo caminho pela frente quando o assunto é preconceito.
Ainda temos dados massacrantes sobre como negros são maioria na pobreza extrema e minoria nos cargos de gerência (ou mesmo nos papéis de novela); sobre como mulheres são violentadas por parentes ou pessoas próximas (ou ganham salário 30% menor que homens na mesma função); sobre a quantidade de gente que morre por problemas ligados à anorexia e bulimia porque a sociedade lhe diz que seu corpo é inadequado (ou de gente que se suicida por essa mesma razão); sobre como um homossexual morre a cada 28 horas vítima de homofobia (ou como isso ainda não é crime).
O preconceito não está "só nos olhos de quem vê", ele está nos ombros de quem carrega, e os números não mentem: ele é real.
E sabe como a gente pode ajudar, e ter empatia de verdade? Parando de fingir que o problema é dos outros, que preconceituoso é o vizinho, que racista é a torcedora do grêmio, que estuprador é um monstro verde que você nunca viu. Parando de criticar só o preconceito alheio escancarado e olhando pra dentro, pro nosso próprio preconceito escondidinho e velado.
Se você faz piadinha de negro, mas acha que tudo bem porque é só brincadeira: não está tudo bem, porque ainda que você (que curiosamente deve ser branco) ache que não tem problema, você está ajudando a reforçar um estereótipo e sendo conivente com todos aqueles números feios e enormes que constroem o racismo.
Se você usa "menininha", "gay", "gordo" ou similares como xingamento ou "zueira", você está - ainda que de brincadeirinha - reforçando que essas coisas são pejorativas e ruins. As palavras tem um poder enorme, e quando a gente usa esses termos dessa forma, estamos sim reforçando preconceitos já enraizados na sociedade (mesmo que de dentro da nossa bolha, não consigamos vê-lo).
Se você vê alguém tendo atitude preconceituosa ou reproduzindo um discurso de ódio, e não fala nada pra não ser "o chato politicamente correto", você está sendo conivente.
A violência, a opressão e o preconceito não acontecem num vácuo. Acontece porque nós ajudamos a criar um ambiente que é conivente à esse preconceito. Nós criamos um ambiente em que estupro é exagero, em que racismo é só gritar "macaco", em que ser "viado" é uma coisa ruim, em que ser gordo "não pode ser saudável". Nós, com as nossas palavras e brincadeirinhas, criamos este ambiente.
E não é fácil deixar de ser conivente, pois vivemos numa sociedade que nos ensinou que tudo bem ter essas atitudes de preconceito velado diariamente, e aí se indignar quando um caso de preconceito extremo sai na mídia. A sociedade não nos deixa ver o quanto isso é contraditório, não quer que a gente "saia da matrix"...
Para ver, e realmente ajudar o próximo, precisamos OUVIR quem sofre com essa opressão, e aos pouquinhos, com humildade, ir desconstruindo esse preconceito que já mora dentro de nós.

E aí, você já se desconstruiu hoje? 

Desejo do dia: Humildade

Desejo do dia para o mundo: humildade. 
Quanto mais me envolvo com as lutas das "minorias" contra o preconceito - porque preconceito social, racismo, machismo, homofobia, transfobia, tudo isso ainda mata muita gente todos os dias; e percebo que tem gente que ainda acha que mesmo sendo "homem/branco/cis/hétero/classe média" está em posição de dizer que tal coisa é exagero e tal coisa não é, e invalidar a luta alheia sem nunca ter sentido o preconceito na pele, percebo que a gente precisa de humildade.
Quanto mais pesquiso e ouço diferentes opiniões sobre política e percebo que não existe uma "fonte de todo o mal", não existe só um partido correto e não existe isso de "se vc é de esquerda deve ser burro" ou "se vc é de direita é mal intencionado" - mas as pessoas continuam agindo como se fossem experts do assunto e como se houvesse uma verdade absoluta; percebo que a gente precisa de humildade.
Quanto mais vejo informação falsa sendo divulgada, mídias sensacionalistas e tendenciosas sendo interpretadas como "o livro da verdade", quanto mais vejo gente declarando sem vergonha alguma nas redes sociais que fica feliz com a humilhação alheia, que dispara acusações infundadas sem pensar que toda ação tem sua reação, que gostaria que tal pessoa/grupo político/grupo religioso morresse; quanto mais vejo que não se sabe diferenciar Liberdade de expressão e opinião de Discurso de ódio, percebo que a gente precisa de humildade.

Eu, você, eles, todos nós estamos desesperadamente precisando de humildade.